sexta-feira, 28 de março de 2008
Cinema: Uma Visão da História
Nos anos 70 do século XX Marc Ferro relevou o olhar do cinema sobre a História constantando que a História no cinema reproduz frequentemente as correntes de pensamento dominantes ou as que põem estas em causa. Promovido o cinema a objecto como forma narrativa emblemática da fragmentação da memória colectiva, a estrutura fragmentária, as truncagens, a veiculação de conteúdos controlados e de textos oficiosos não impuseram facilmente as actualidades cinematográficas à análise. Até ao início da década de 90 do século XX, a investigação sobre elas permaneceu incipiente. "De maneira que a história-narração construída com estas actualidades permanece, a muitos olhos, suspeita, ainda que ela seja a única a poder ensaiar a criação de uma narrativa coerente sobre um problema de conjunto, sobre uma fase da história deste século (...)", constatou Ferro em "Cinéma, Une Vision de L´ Histoire" (Ferro, 2003, p.9).
A grande utilização pelos sistemas de propaganda e como produção de prestígio pelas majors torna, porém, a análise deste género incontornável. Após a realização de alguns trabalhos percursores – de Raymond Fielding, nos EUA, e de Anthony Aldgate na Grã-Bretanha – muitas investigações foram entretanto empreendidas. O estudo do NO-DO, em Espanha; das Actualités Françaises, do Cine Jornal Brasileiro, do Jornal Português (feito por mim e que resultou na publicação de "Salazar Vai Ao Cinema"), entre outros, inscrevem-se numa tendência forte. Tal vem também questionar/complementar o modelo internacional dominante - que observa uma história do cinema em que a ficção é o sustentáculo da produção - que não se aplica ao cinema português anterior ao 25 de Abril.
quinta-feira, 27 de março de 2008
Feitiço do Império
No final da década de 30 do século XX, a Agência Geral das Colónias patrocinou a "Missão Cinegráfica (não é gralha) às Colónias de África", chefiada pelo Major Carlos Selvagem, a qual teve como director artístico António Lopes Ribeiro, então no princípio da sua carreira como cineasta do regime.
Do material filmado durante a missão montaram-se posteriormente vários documentários que ainda conto ver no ANIM. Algumas imagens de grande interesse foram incluídas no "Feitiço do Império". Trata-se do segundo dos dois únicos filmes de propaganda assumida pagos pelo Estado Novo.
O primeiro, "A Revolução de Maio", era a história de um comunista que se rendia ao amor de uma menina da pequena burguesia e à mística de Fátima, rendendo-se depois também aos nobres ideiais da Pátria, que é como quem diz, de Salazar.
Já "Feitiço do Império" conta a história de um luso-descendente que vive nos EUA e está prestes a trocar a sua nacionalidade pela norte-americana. O pai convence-o a conhecer Lisboa, que ele nunca viu, e a pequenez da cidade não o cativa. Mas quando desembarca na Guiné, e depois em S. Tomé e em Angola, tudo muda. Claro que há mais uma paixão a ajudar. Uma menina que lhe recusa um beijo por não se tratar de coisa de nada para uma portuguesa que se preze.
O filme sobreviveu amputado, sem a primeira bobina - os primeiros 15 a 20 minutos - e sem banda sonora. E nem o enredo nem as actuações são em molde a resgatar a obra. Mas as imagens de África - as imagens documentais, em que a câmara se limita a olhar a realidade que se deixa olhar - são extraordinárias. Voltaremos a elas com detalhe.
domingo, 16 de março de 2008
Da natureza das imagens
As imagens que tenho visionado no ANIM são imagens cinematográficas de propaganda. Foi estas especificamente que escolhi olhar. No caso concreto das colecções que escolhi (Jornal Português e Imagens de Portugal) trata-se de jornais cinematográficos de actualidades - antepassados dos telejornais se quiserem. Como tal, com o advento e popularização das televisões foram-se extinguido e desapareceram quase completamente na década de 70 do século XX.
Portugal não teve uma produção muito intensa. Não podia ser de outro modo porque a escassez de actualidades é quase correlativa à escassez de filmes de ficção.
No entanto, houve fases em que pela sua regularidade - no caso das Imagens de Portugal - ou mesmo pela escassez relativa da produção ficcional - no caso do Jornal Português - se afirmaram como incontornáveis na propaganda do Estado Novo e como fontes para uma percepção das representações pelo regime.
Quando defini o meu objecto ainda encetei um esforço para encontrar imagens de natureza etnográfica de produção nacional. Espero chegar lá um dia. Entretanto, as de Jean Rouch, impõem-se, com toda a sua vibração.
Portugal não teve uma produção muito intensa. Não podia ser de outro modo porque a escassez de actualidades é quase correlativa à escassez de filmes de ficção.
No entanto, houve fases em que pela sua regularidade - no caso das Imagens de Portugal - ou mesmo pela escassez relativa da produção ficcional - no caso do Jornal Português - se afirmaram como incontornáveis na propaganda do Estado Novo e como fontes para uma percepção das representações pelo regime.
Quando defini o meu objecto ainda encetei um esforço para encontrar imagens de natureza etnográfica de produção nacional. Espero chegar lá um dia. Entretanto, as de Jean Rouch, impõem-se, com toda a sua vibração.
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